A visão crítica do Ensino Jurídico

Tercio Sampaio Ferraz Jr.

 

A situação atual do ensino jurídico, que é de impasse, foi gerada pelas transformações sociais, a partir de 1950. Marcadas pela massificação, essas mudanças determinaram as normas produzidas pelo Estado; o advogado especializado — transformando o caráter e a imagem da profissão – e a instituição de técnicas e perspectivas voltadas para a eficiência, o que vem imprimindo ao Direito uma visão técnico-legal.

A incumbência de falar sobre o ensino do Direito, na perspectiva de uma visão crítica, é uma incumbência que às vezes parece que vai me cansando um pouco, ao longo dos anos. Afinal de contas, desde 1972, portanto há onze anos, que reflito sobre este tema com uma certa insistência. Apesar desse cansaço, ao reparar que o grau de transformação das condições de ensino do Direito no Brasil é pequeno, parece que podemos sempre vislumbrar, aqui e ali, algumas alterações no quadro que, com todas as dificuldades, acaba nos estimulando a mais uma vez pensar sobre a questão do ensino.

O tema está inserido dentro de um congresso de e para advogados. Acho que deveríamos partir desse dado; não vamos discutir, de uma forma talvez demasiadamente circunscrita, a universidade e a questão do ensino. Gostaria de enfocá-lo criticamente, como está determinado no tema proposto, mas estabelecendo esta correlação à temática do exercício e da profissão na advocacia. Nesse sentido, se pensarmos no ensino jurídico em relação ao exercício profissional, eu gostaria de fixar, primeiramente e de uma forma didática, algumas variáveis; isto é, vamos ter que fazer correlações entre alguns temas. Estes temas, para reflexão dos que estão aqui, proponho que sejam os seguintes: o primeiro dado é a própria sociedade; o segundo dado é a concepção do Direito como um fator social; o terceiro dado é o papel do advogado como um agente social; e a quarta variável, o quarto dado, seria então o ensino jurídico como instrumento de formação profissional.

Vamos trabalhar portanto com quatro variáveis, para pensarmos o problema do ensino, sendo que o próprio ensino é uma dessas variáveis. Repito: a sociedade, o próprio Direito, a figura do advogado, o advogado e, finalmente, a ciência do Direito, presumindo antes as quatro mencionadas.

Uma rápida pincelada a respeito de cada uma dessas variáveis. A primeira, o fator social, a sociedade. Aqui poderíamos fazer, num retrospecto muito breve, uma menção ao que chamaria de mudanças sociais no Brasil desde 1950, pelo menos. Partindo-se do pressuposto de que até 1950 tínhamos nitidamente no país uma sociedade de características patrimonialistas, mais rurais, a partir de 1950 tivemos, como todos sabem, uma transformação social no sentido do advento da chamada economia empresarial. Aparece a partir dos anos cinqüenta uma dicotomia na estrutura das empresas e da vida empresarial brasileira, que antes praticamente não existia, qual seja a dicotomia entre a propriedade e o controle da propriedade. Isto teve muita importância na organização da sociedade brasileira nos anos cinqüenta. Quando a economia era fundada na propriedade, principalmente na idéia da propriedade rural, o seu alvo fundamental era o lucro. Quando a economia começa a se estruturar em torno do controle da sociedade, o controle acionário, o grande alvo econômico passa a ser regido por critérios de eficiência. Nem sempre a busca do lucro coincide com a busca da eficiência. Apenas para citar um exemplo, a mudança de mentalidade é crucial nessa diferença: o dono da empresa é o homem para quem o lucro é importante, o gerente é aquele para quem a eficiência é importante. Ainda que não seja demasiadamente significativa, essa mudança de mentalidade na estrutura econômica é um dado importante dos anos cinqüenta para cá e isso vai influir no ensino e no exercício da advocacia.

O segundo dado importante na transformação da sociedade dos anos cinqüenta para cá, me parece, é a passagem para uma organização político-administrativa, do que era antes uma burocracia patrimonialista, da qual nós não nos livramos totalmente. Burocracia patrimonialista é aquela em que o bem gerido, o bem administrado, é tido mais ou menos como uma quase propriedade daquele que o administra, ou pelo menos ele toma aquilo como se fosse dele. Pois bem, passamos de uma burocracia eminentemente patrimonialista para uma burocracia de caráter mais instrumental. É verdade que no Brasil jamais nos desligamos daquela burocracia patrimonialista; a administração pública e privada continua sempre tomando os bens administrados como uma coisa própria, com diversas repercussões para a nossa vida política. Mas assim mesmo há uma tendência a tomar o exercício burocrático como um exercício instrumental, isso por força mesmo do crescimento econômico do país. Isso também vai ser importante na análise que estou querendo fazer.

O terceiro aspecto importante na transformação social do Brasil, de cinqüenta para cá, me parece o surgimento nítido da chamada sociedade de massas, que é uma sociedade do nivelamento, sociedade onde o consumo se endereça a todos sem fazer diferença; é aquela sociedade onde os caracteres diferenciadores do consumo são suplantados pela intensa produção que deve, em tese, atingir a todas as camadas populacionais, provocando em conseqüência — e este seria o nosso quarto fator de mudança social —, o aparecimento do Estado interventor, como forma de controle da sociedade de massas.

Portanto, quanto à primeira variável, dos anos cinqüenta para cá temos o advento da economia empresarial, passagem para uma burocracia instrumental, o surgimento de uma sociedade de massas e o aparecimento do Estado interventor.

O segundo fator que nós temos, a segunda variável, é a própria concepção do Direito dentro dessa sociedade como um dado que vai interagir com a própria sociedade. Antes dos anos cinqüenta, tínhamos uma concepção do Direito — quando falo em concepção do Direito eu estou pensando na mentalidade média daqueles que se ocupam do Direito e que acaba refletindo na população de um modo geral; então estou pensando em advogados, em juizes, enfim, empresários e na medida em que isso se expande, há o reflexo, na mentalidade da população, sobre sua concepção do que é o Direito. Pois bem, repito, antes dos anos cinqüenta tínhamos, por assim dizer, uma tradição que eu chamaria de tradicionalista do Direito. O Direito tinha basicamente um estatuto, um caráter de natureza ética, vamos chamar assim, onde talvez sobressaísse a idéia de Direito como uma forma de organização justa da socieade. O Direito como disciplina da sociedade, basicamente como uma disciplina justa da sociedade. Isto significa na mentalidade média, do sendo comum, que o Direito é algo dado socialmente e que ele não é criado, ele não chega a ser produzido. O Direito não é produto de urna fabricação. "Os direitos existem e devem ser respeitados e são trazidos pela tradição, de geração para geração" - essa concepção do Direito é a concepção vigente até o início dos anos cinqüenta. A partir dos anos cinqüenta temos a concepção que conhecemos hoje. Não sei se todos estão confiantes nisso: a partir dos anos cinqüenta, o Direito deixa de ser objeto ético, esse dado que é transmitido de geração em geração, que o Estado reconhece, que o Estado aperfeiçoa, e passa a ser fundamentalmente identificado com normas que são produtos de uma máquina, que tem exatamente essa função, e nós começamos cada vez mais a identificar essa máquina com o próprio Estado. Isto é, o Direito é norma e essa norma é produzida pelo Estado. A idéia de que o Direito é um produto, quer dizer a identificação do Direito com as normas, nos conduz a pensar que, como qualquer produto, o Direito tem que ser consumido pela população e ao ser consumido ele tem um valor como qualquer produto econômico, um valor de uso, um valor de troca. O Direito pode ser utilizado por quem tem interesse e precise dele, pode ser trocado quando eu não mais preciso dele, mas, na medida em que se transformou em um produto do Estado, tende a perder o valor, não tem mais um valor próprio, por assim dizer. O Direito, a partir dos anos cinqüenta, cada vez mais, na mentalidade media da população, especificamente dos profissionais, se instrumentaliza, passa a ser um instrumento do qual eu me utilizo ou abandono, desde que ele não me sirva mais; ou troco, como se o Direito vigente também se tivesse tornado inútil.

“Santiago Dantas começa a perceber que as transformações sociais atingiam o Brasil rapidamente, enquanto o ensino do Direito ficava atrelado àquela visão humanista e generalizante, portanto em descompasso com a nova realidade.”

Temos, portanto, a partir dos anos cinqüenta, a passagem de uma concepção que chamaria de tradicional do Direito, este como um objeto ético, para uma concepção instrumental do Direito — como instrumento de ação, como objeto de consumo que se troca na medida das necessidades. A parafernália da legislação dos nossos dias mostra claramente isso.

O terceiro fator, que me parece importante na apresentação que lhes fiz, se refere ao papel do advogado neste quadro. Aqui também nós temos a partir dos anos cinqüenta uma transformação conhecida de todos. Acredito que é a passagem daquele advogado tradicional ou anterior aos anos cinqüenta, para um novo tipo de profissional que vai se adequando às transformações sociais e às novas concepções do próprio Direito. O advogado tradicional, digamos assim, para defini-lo numa palavra, é o advogado generalista, o profissional que, além de ter a sua banca, se intitula pura e simplesmente advogado.

Está aberto a todas as questões, questões essas que circunscrevem as relações patrimonialistas de uma sociedade com características eminentemente rurais, numa concepção do Direito como objeto ético. Pois bem, a partir dos anos cinqüenta nós assistimos a uma transformação, começa a aparecer o advogado especialista, o especializado. Esse advogado especializado, a partir dos anos cinqüenta começa "a surgir justamente em função da transformação da sociedade para uma economia empresarial. O advogado especializado é aquele que ainda se mantém .como profissional liberal, mas que já não se intitula mais pura e simplesmente advogado, denominando-se advogado trabalhista, tributário, etc. A partir dos anos setenta esta tendência se acentua como uma transformação importante na vida profissional da advocacia que é a do aparecimento do advogado especializado e assalariado; portanto uma certa transformação no status da profissão como profissão liberal. Não que desapareça a profissão liberal, ela continua aparecendo numa dimensão importante; e não apenas em centros maiores, mas também nas periferias do centro, nas bancas de advogados que continuam existindo. Pelo interior do Brasil isto ainda prevalece naqueles centros que não acompanharam a evolução que estou mencionando aqui, circunscrita mais ao centro-sul do país. De qualquer maneira a figura do advogado assalariado começa a aparecer e a dominar pelo menos o modo como tendemos a ver o advogado mais contemporaneamente. Isto é, essa imagem do advogado assalariado das burocracias estatais e das burocracias paraestatais e empresariais privadas, começa a ser uma figura importante para a qual temos que dar atenção. Quando pensamos no advogado, já não pensamos imediatamente na figura do profissional liberal. A figura do profissional assalariado dos anos setenta para cá, começa a ser uma figura também importante.

Esta transformação, no caráter e na imagem da profissão, também é uma variável importante na correlação.

A quarta variável — o alvo, por assim dizer, dessa curta reflexão para a qual tenho alguns minutos — é o ensino propriamente dito.

É o que aconteceu com o ensino em todos esses anos, neste quadro. Antes dos anos cinqüenta tínhamos aquela sociedade patrimonialista numa economia de propriedade voltada para o lucro, numa concepção do Direito como objeto ético e, do advogado tradicional, generalista. Nessa sociedade tínhamos um ensino jurídico caracterizadamente humanista e generalizante; a idéia era a formação de um profissional, para usar uma palavra clássica, em termos de uma prudência ética. O bom advogado era ou seria aquele profissional que tivesse uma bagagem cultural em termos brasileiros, uma bagagem cultural, uma erudição sobretudo e, por que não?, literária, de peso. Enfim, era o homem que tivesse sido capaz, em sua juventude e continuasse a fazer isso, de ler grandes clássicos da literatura brasileira, portuguesa, inglesa e se possível grega, latina. É verdade que esse ideal letrado, que deu inclusive a imagem do bacharel, bacharelesca, a imagem desse letrado, nunca correspondia exatamente àquilo que acontecia na prática e houve muita transformação desde 1927 até 1950. Mas de qualquer maneira a figura do advogado identificado com esse tipo de humanista bacharelesco, caracteriza o ensino do Direito; aulas são nitidamente aulas professorais, aulas magnas; o bom professor é aquele que sabe falar ao seu público; e o seu público é composto de ouvintes atentos à sua retórica exuberante. Isso caracteriza o ensino do Direito até os anos cinqüenta, quando começa a haver uma certa inquietação com respeito a essa situação. Essa inquietação é nítida no famoso discurso de Santiago Dantas, no fim da década de cinqüenta. Santiago Dantas começa a perceber que as transformações sociais atingiam o Brasil rapidamente, enquanto o ensino do Direito ficava atrelado àquela visão humanista e generalizante, portanto em descompasso com a nova realidade. Uma visão " humanista e generalizante que cabia, por exemplo, para o tipo de aluno que procurava a faculdade, de Direito, em geral ligado aos grandes proprietários rurais, ligado à burguesia afluente da sociedade; mas um ensino ainda voltado para uma pequena elite que, pouco a pouco, a partir dos anos cinqüenta, começara a entrar em crise e a se desfazer dessas características. Daí as transformações, as tentativas de especialização no ensino, que a partir dos anos sessenta se tornam uma preocupação nítida. Estudei aqui na faculdade de sessenta a sessenta e quatro e eu me lembro das campanhas estudantis da época, no sentido de provocar essa especialização e fazer do ensino jurídico um ensino mais voltado a especialidades e menos ligado à visão humanista. Isso demorou talvez desde a manifestação de Santiago Dandas até o fim da década de sessenta, quando assistimos ao processo de luta dentro das universidades no sentido de sua transformação no caminho da especialização, o que acaba acontecendo com o aparecimento do novo currículo mínimo para as faculdades de Direito, já anunciando a década de setenta.

Esse novo currículo mínimo tentou adaptar o ensino jurídico às transformações sociais, instituindo técnicas, perspectivas que deveriam voltar-se à eficiência. Isto é, a economia começava a passar, começava a absorver os critérios da eficiência acima mesmo dos critérios do lucro. A eficiência do profissional começava a contar mais do que, por assim dizer, os resultados em termos do lucro, na condução da empresa, da empresa do Estado, na empresa privada. Com isso, a especialização deveria atender a essa transformação social, bem como à transformação social em que o Direito então começava a se instrumentalizar. Ora, isso nos conduziu ao ensino do Direito cujo padrão passou a ser o padrão da eficiência especializada. Isto em termos de padrões objetivos, para aquilo que se objetivava. A prática no entanto nos revelou outra coisa. A verdade é que já nos anos sessenta a universidade brasileira estava bastante diversificada: as faculdades de Direito haviam perdido, por assim dizer, uma certa supremacia cultural que tinha tido até então. Com isso a especialização dentro das faculdades de Direito foi nos conduzindo – e agora estou pensando genericamente, no país inteiro — a um ensino cada vez mais legista, cada vez mais voltado para o conhecimento abrangente de normas e do Direito, como norma e como Direito instrumentalizado, numa especialização crescente dessa visão técnico-legal do Direito. E isto até mesmo como defesa, isto é, numa sociedade onde todos se especializavam, os juristas tinham que ter a sua especialidade; e a sua especialidade parecia convergir para o ensino do Direito como o ensino das normas vigentes. Com isso houve um progressivo desligamento, curioso em relação à própria realidade social, na medida em que acabamos por entrar num processo de formação do profissional como um agente instrumental da administração privada ou pública. Isto é, a idéia de que o profissional do Direito é alguém que realmente ajuda na administração, ajuda o economista, ajuda o administrador. A idéia do próprio profissional como ente especializado, que começou a ser requerido pela sociedade, cada vez maior. Na verdade, esse tipo de especialização ocorre também com a massificação do ensino, a partir dos anos setenta. A explosão demográfica ocorre dentro das universidades brasileiras e essa especialização acaba ocorrendo no momento em que também a massificação do ensino ocorre pela pressão da demanda estudantil e o desaparecimento daquela velha elite estudantil. Ora, o ensino massificado, junto com essa tendência à especialização acabou transformando o Direito em objeto — ciência do Direito em disciplina que o estuda, e o profissional do Direito naquele que o exerce, numa espécie de instrumento de segundo grau para todas as demais disciplinas. Quero significar com isso que acabamos produzindo uma espécie de especialista que não chega a ter um status de um tecnólogo, como, por exemplo, um engenheiro, um médico. Não estou usando a palavra aqui no sentido pejorativo, mas no sentido de um profissional que se aproxima de um nível técnico. A palavra é horrível, soa mal ao profissional, mas ele se aproxima mais do nível técnico. A grande massa profissionalizada acaba percebendo isso. Quantos profis-sionais não conhecemos que, sendo assalariados de burocracias empresariais ou estatais, ou até mesmo assalariados de grandes escritórios de advocacia, percebem que o seu trabalho se resume a um trabalho técnico de segundo grau? Ele simplesmente faz rotinas, pequenas rotinas e a percepção disso se espalha no senso comum dos juristas e acaba fazendo com que as faculdades de Direito, mesmo sem o quererem muitas vezes, se adaptem a essas condições. E começam então a formar o que podemos entender como pseudo-especialistas.

Nos anos oitenta desembocamos nessa situação: as transformações sociais exigiram transformações no ensino, as transformações do ensino acompanharam, num certo sentido, as transformações sociais, mas foram atravessadas por fenômenos como a massificação e redundaram numa pseudo-especialização em termos de formação universitária do jurista.

A situação atual é de impasse, a massificação é um dado que incomoda; incomoda à Ordem dos Advogados, por exemplo. Em 1964, quando me formei aqui, havia aproximadamente vinte mil estudantes de direito no país inteiro, hoje temos mais de cem mil. A quantidade de faculdades de Direito se espalhou pelo país inteiro e se espalhou de uma forma desequilibrada, porque temos ainda faculdades de Direito no país cuja estrutura de ensino está bastante ligada à formação daquele advogado tradicional, generalista. Portanto, um ensino mais humanista, misturado com essa especialização que é uma pseudo-especialização. Como temos também faculdades, como é o caso da faculdade de Direito da USP, onde essa especialização teve já um desenvolvimento muito maior, onde aquela antiga formação humanista praticamente desapareceu, para desespero de muitos de seus professores que não encontraram mais no aluno aquele interlocutor para uma visão cultural, crítica da própria sociedade.

Esta é a situação em que nos encontramos hoje. Pediram-me uma visão crítica do ensino. Não entrei nos detalhes técnicos do problema do ensino, mas me pareceu importante, se queremos ter uma visão crítica para fazermos a correlação entre ensino, sociedade, exercício da profissão, vida econômica, tal como apresentado. Qual é a saída para essa crise? Essa é uma boa demanda que estamos fazendo; e me faço essa pergunta há pelo menos doze anos.

Debates

Dr. José Célio Manso Vieira – A mesa receberá as proposições que os senhores quiserem encaminhar.

Dr. Fernando Jacob Filho – A falta de maiores conhecimentos, a ausência da cultura clássica que tantos recursos oferece aos advogados, é uma das causas da busca de meios antiéticos visando a sobrevivência profissional. Filosofia, sociologia, Direito romano e lógica, não deveriam voltar obrigatoriamente a fazer parte do ensino jurídico no Brasil? A maioria das faculdades particulares aboliu estas matérias.

Dr. Tércio Sampaio Ferraz Jr. — Concordo com a pergunta. Há um ano atrás, conjuntamente com mais quatro colegas de diferentes pontos do país, recebi uma convocação do Ministério da Educação, que por sua vez tinha sido convocado pelo Conselho Federal de Educação, no sentido de propor uma reformulação do currículo mínimo para as faculdades de Direito. E ao estudar a questão, justamente essa comissão começou a perceber que o problema do currículo na verdade se ligava a todos estes fatores aqui mencionados e, depois de um ano de refletir sobre o assunto, chegou a conclusão de que poderíamos tentar, pelo menos a título de provocação, propor um novo currículo, não propriamente preocupados com o currículo daquilo que deve ser lecionado, mas preocupados em propor um currículo alertando as universidades brasileiras para o tipo de formação que seria interessante dar ao jurista. A conclusão a que chegamos foi aproximadamente nesse sentido. A experiência nos tem mostrado — não sei qual é a experiência de vocês, mas a experiência do grupo, a minha própria experiência — que o bacharel que sai da faculdade e adentra a vida profissional e que traz consigo uma formação teórica mais assentada, vamos dizer assim, mais abrangente, que teve uma formação teórica mais firme, ainda que tivesse tido menos formação especializada, mas que teve essa formação teórica nas teorias gerais de processo, de Direito civil, do Direito penal, enfim, que conhece a teoria geral, curiosamente esse bacharel tende a aprender mais rapidamente, e se adapta melhor às condições do próprio mercado. Isto nos levou então a imaginar que a formação especializada engana um pouco, ela cria a ilusão de que o bacharel é capaz de sair da faculdade com uma especialização em Direito do Trabalho e, imediatamente, começar a sua atividade profissional, quando na verdade o bom profissional é aquele que sai com nenhuma especialização nítida ou pelo menos nenhuma especialização tão demarcada. É aquele sujeito que é capaz de saltar de um campo para o outro, ainda que ele exerça a sua profissão num campo estritamente especializado. A grande arte — pelo menos é aí que chegamos — da advocacia não está, propriamente, na informação especializada, mas na capacidade , de comparar os diversos campos para descobrir, para inovar. Está naquele sujeito que, de repente, é capaz de, estudando estritamente um problema de Direito tributário, ir buscar, em alguma instituição ou teoria do Direito civil, uma saída para o problema ao qual lhe falta, na praça, uma solução. A capacidade de passar de um campo para o outro só é dada àquele que teve basicamente uma formação abrangente. A formação abrangente exige essas disciplinas tidas como humanistas e um pouco postas de lado, porque no fundo elas acabam dando a tônica da visão teórica do Direito. Agora, isto tem um risco na situação atual, isto é, a implantação de um ensino — não vou dizer de novo humanista porque a volta ao passado é muito difícil e talvez nem seja recomendável — teórico mais consistente, tem um risco do qual estou pessoalmente consciente: esse ensino exige professor. Lamentavelmente, o que ocorreu na formação do profissional de Direito, ocorreu na formação dos professores de Direito. Os professores de Direito são formados nessa forja que forma os profissionais. Qualquer tentativa de remodelação do ensino esbarra sempre nessa dificuldade: onde é que vamos achar professores para fazer isso? Talvez num centro como São Paulo a gente ache, no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte, mas quando começamos a nos afastar para os interiores aí do Brasil afora, não precisa ir muito longe, fica mais difícil encontrar o profissional do ensino adequado a esta situação. Para não dizer que a gente está num mato absolutamente sem cachorro, o Ministério da Educação — não estou fazendo apologia nem defesa do Ministério — tem pensado no assunto através de uma das suas instituições, que é a do Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior, que há três anos e meio, atendendo a uma proposta minha inclusive, resolveu instaurar no Brasil um primeiro experimento, nesse sentido de formação de professores de Direito, que pudesse atender essa transformação, essa mentalidade abrangente a que o perguntador refere. Assim é que de três anos e meio para cá nós temos aqui, na faculdade de Direito do Largo São Francisco, uma experiência nesse sentido, que andou sendo publicada pelos jornais aqui de São Paulo, que se chama Programa Especial de Treinamento, onde, quando termina o primeiro ano, abrimos um concurso e escolhemos cinco alunos interessados e bons alunos, se possível, que passam a viver dentro da faculdade em tempo integral e passam a ter uma formação paralela à formação comum que têm todos os outros, com o intuito de formar o futuro professor de Direito. Hoje temos vinte alunos aqui na faculdade trabalhando nesse regime. É um experimento que até agora tem dado certo. A CAPES está entusiasmada pois agora é um experimento para os próximos dez, quinze anos. Talvez só daqui a dez, quinze anos é que a gente vai ver se isto teve efeito na formação do professor, que é fundamental para qualquer alteração no ensino. O experimento aqui está dando certo e a CAPES está pensando em abrir outros do gênero em outras faculdades brasileiras.

Dr. Walter Rodrigues - Não é bom que haja 100 mil estudantes de Direito, principalmente se pudessem atuar no mercado predominável dos necessitados?

Dr. Tércio Sampaio Ferraz Jr. — O que me assusta, hoje em dia, não é propriamente o número. Quando ouvimos falar em cem mil estudantes de Direito ou falar em setenta mil advogados inscritos na Ordem, só em São Paulo, o número realmente impressiona e tende a nos levar a crer que isto é um desvirtuamento do ensino e do próprio exercício profissional. Mas tenho a impressão de que esta. é uma atitude um pouco de avestruz. Não há recuo na história. Não quero entrar nesses problemas, mexe inclusive com certas posições da OAB. Mas a pergunta me leva um pouco a este tema, que é do número de profissionais com relação ao número de estudantes no país inteiro. Tenho a impressão de que não é possível recuarmos; e isso não é um fenômeno brasileiro, não dá para voltar atrás. É uma ilusão – me permita a palavra — elitista imaginarmos uma diminuição do número de profissionais através, por exemplo, de um diminuição do número de estudantes. Isto é impensável no Brasil como é impensável no mundo inteiro. O problema da superpopulação estudantil e profissional não é um problema brasileiro, é mundial; acontece na Itália, na Alemanha, nos EUA. E a sociedade de massas, onde o ensino se transformou num objeto de consumo. Não poderíamos, de repente, fazer com que os hábitos populacionais se diversifiquem, de novo, em relação a refrigerantes, voltando cem anos atrás, onde cada família fazia o seu. Claro, isto é impensável na comunidade contemporânea, onde a China bebe Coca-Cola. Algo parecido se dá em relação a esta massa estudantil e a massa de profissionais. O que temos de pensar, portanto, são fórmulas eficientes de controle da qualidade. Estou falando um pouco como tecnocrata, mas acho que não há outro recurso senão falar desse modo. Temos, sim, cem mil estudantes de Direito no país inteiro, ainda sendo formados como se todos devessem um dia se tornar ápices na sua profissão. Isto é, a intenção é que cada um desses cem mil estudantes se torne um grande parecerista numa grande cidade brasileira. Temos uma visão do ensino voltada para este grande profissional — e aí a tendência é perdermos o controle do ensino, como professores. As faculdades perdem o controle do ensino na medida em que jogam todas as possibilidades para a formação desse profissional que depois, inclusive, deve encontrar um emprego condizente. Criam a figura esdrúxula — e o próprio estudante sente isso, que ele não está preparado para a vida profissional. Por que? Porque ele foi mal formado e, obviamente, em face do grande número — cem mil mal formados para serem grandes advogados — ele nunca será daquele modo, apesar de formado para isso.

A pergunta, falando aqui do número, também me conduz à reflexão de que a necessidade do mercado é muito diversificada, mas o ensino não olha para essa diversificação. Continuamos realmente formando profissionais que vão ser grandes advogados. Eventualmente vão ser chefes de assessoria jurídica de grandes empresas. Ora, essa formação não adequada a outras necessidades sociais, não só provoca esse desequilíbrio, quando esse advogado vem depois a enfrentar a realidade, mas também acaba tendo um efeito de feed-back, quer dizer, isso afeta a imagem que o estudante também tem da profissão. Quando ele entra na faculdade de Direito, vem com uma série de ilusões; a ilusão de transformar a sua vida, de ser esse advogado que a imagem do senso comum lhe transmite. E mantém essa ilusão nas faculdades de Direito talvez por dois anos. Aí essa ilusão desaparece e ele começa a trabalhar contra qualquer tentativa de mudança ou melhoria; contra qualquer transformação do próprio ensino jurídico; ele só quer sair daquilo o mais rapidamente possível. O problema do grande número de estudantes tem de ser enfrentado não diminuindo o grande número; não há condições de se fazer isso. Devemos, é verdade, tentar um controle maior da qualidade em termos de fiscalização melhor das faculdades.

Não diminuir o número de profissionais de Direito nem de estudantes, mas buscar fórmulas de adaptação às diferentes necessidades. Não vou entrar no tema polêmico do juizado de pequenas causas, mas o próprio Ministério do Trabalho também está falando em árbitros. Parece que isso tende a surgir no país e há até uma necessidade. O professor Walter, que fez a pergunta, é um processualista que deve saber, tenho certeza, que no Brasil há uma imensa desproporção entre o número de juízes e a sua população. É forçoso imaginarmos que a maior parte dos conflitos sociais no Brasil não é resolvida pelo Poder Judiciário. Ora, mais dia menos dia nós vamos ter que enfrentar a realidade dos árbitros, dos mediadores. Esse é tipicamente um mercado que ignoramos na faculdade de Direito, ninguém pensa nisso. E como este, provavelmente deve haver outros. Acho que a fórmula mais razoável de enfrentar o grande número seria nos adequarmos a ele, tendo em vista a diversificação.

Dr. José Célio Manso Vieira — Se o professor Tércio me permitir, trago alguns dados que poderão ilustrar bem a questão. Durante quatro anos presidi a comissão de seleção da Ordem dos Advogados. Nesse período, inúmeros bacharéis em Direito pediam inscrição na Ordem. Posso dizer que grande parte, pelo menos 10% não sabia copiar um formulário. Tivemos oportunidade de indeferir uma inscrição, embora sabendo que nosso ato seria um ato ilegal, porque o candidato, embora portador de um diploma, não tinha condições, nenhuma, de se inscrever e exercer a profissão.

Esse controle a Ordem pode ter. A própria Lei 4.215 permite ao conselho da Ordem suspender o bacharel quando ele demonstra erros, quando comete erros reiterados demonstrando a inépcia profissional. A cada semana temos uma reunião em que vinte processos são julgados; cinco, fatalmente, se referem à inépcia profissional.

Participei já de três concursos como membro da banca examinadora de concurso na Justiça do Trabalho. O número de candidatos que acorrem a essas bancas é sempre acima de mil. O número de vagas nesses concursos é de mais ou menos sessenta, setenta. Nunca conseguimos preencher as vagas. Em três concursos conseguimos aprovar: no primeiro, treze candidatos; no segundo, quinze; e no terceiro, dezoito. O problema fundamental é exatamente a falta de capacidade intelectual do bacharel que vai procurar esses concursos. O dr. Tércio fixou bem uma questão: o problema fundamental decorre não só da estrutura do curso jurídico como também da falta de fiscalização das faculdades. Todos sabemos das chamadas "fim de semana", onde o candidato vai no fim de semana e acaba no final do curso recebendo um diploma. Já ocorreu o fato de um cidadão matricular-se numa faculdade aqui da periferia de São Paulo; no ano seguinte ele foi obrigado a mudar-se para Brasília e nunca mais voltou à faculdade: lá matriculou-se em outra faculdade, fez um curso de Direito; cinco anos depois recebeu um telegrama para vir retirar o diploma, que já estava pronto.

Este é um dos aspectos reais do nosso ensino.

Franqueio o microfone aos senhores que quiserem formular questões oralmente.

Plenário – Sou um dos que se formaram aqui na escola, na turma de sessenta. Da década de sessenta para cá, na realidade, aconteceu a massificação do ensino jurídico e, com essa massificação, houve uma demanda extraordinária de novos mestres do Direito, para ensinar aos novos estudantes de Direito, que surgiram no Brasil assim de repente. Acredito que essa nova plêiade de professores não estava intelectualmente preparada para ministrar o ensino jurídico. Decorre daí que a preocupação do professor de Direito, não suficientemente preparado para o ministério do ensino jurídico, é a de ministrar o Direito positivo enquanto mandamento legal. Não se ensina Direito com as suas hipóteses. Então, fico me questionando sobre as colocações de sua palestra. Aqui nesta sala — e eu me recordo muito bem — recebi aulas que não eram aulas, eram conferências do professor Ataliba Nogueira. Realmente prevalecia o magister dixit. Aprendíamos aqui a doutrina do Direito, a filosofia do Direito. Saí da escola não sabendo como redigir uma petição inicial, mas saí sabendo CARNELUTTI. Tive aqui o melhor curso doutrinário de Direito. Hoje, a grande maioria dos estudantes de Direito sai da escola sabendo redigir uma inicial, mas eles não sabem, muito provavelmente, nada de CARNELUTTI, porque há uma insuficiência do ensino jurídico. Tenho um exemplo disso — dentro da minha casa: a minha filha é estudante de Direito, quartanista, sabe hoje muito mais Direito civil positivo como mandamento legal do que eu sabia no quinto ano, mas se eu lhe perguntar quem foi CHIOVENDA, vai ter que procurar numa enciclopédia do Saraiva. A massificação não ocorreu só no ensino jurídico, mas também no ensino médico, só que lá a fiscalização é mais atuante, porque os resultados podem ser trágicos, enquanto no Direito a tragédia sempre pode ser relegada. A cada ano que passa eu me surpreendo mais. Tenho clientes cujos filhos não entrando na faculdade de engenharia ou medicina, acabam estudando Direito. Alguns deles, provavelmente, com a vocação incubada. Mas com a grande maioria, nós sabemos, ocorre simplesmente em desvio de vocação. Não lhe parece que, com o tempo, o Brasil simplesmente deixará de ter Juristas, exatamente por essa insuficiência do ensino, que diariamente se verifica nas bancas de exame? Que medida que as nossas autoridades estariam cogitando para esse tipo de fiscalização?

Dr. Tércio Sampaio Ferraz Jr. — Acho que eu próprio chamei a atenção para os problemas da massificação, no sentido de que ela provoca essa desqualificação profissional, que é um mau especialista do Direito positivo — estou falando sempre em média e em média nacional. A massificação, ao meu ver, deve ser entendida principalmente como um processo através do qual todos os objetos, ou todos os objetos da vida social, se transformam em produtos, portanto, em objetos de consumo. É isso que caracteriza principalmente a massificação, não é o número propriamente. Podemos ter fenômenos de massificação com um número relativamente pequeno. O problema é que as coisas em geral acontecem ao mesmo tempo e a presença do grande número transforma todos os objetivos, que constituem meio de comunicação entre os homens, em objetos de consumo. O Direito é um deles. O outro objeto de consumo é o próprio ensino. Quer dizer, a educação se transforma em objeto de consumo; ela só tem valor enquanto pode ser consumida; quando não, troco. Tem valor de uso e valor de troca, mas não tem nenhum valor em si. Isso é o que caracteriza a massificação do ensino. No ensino do Direito isso é característico. Realmente é um objeto de consumo: de fato, estuda-se o Direito porque aquilo pode ter um valor de uso se você for exercer a profissão, ou um valor de troca, pelo menos, se você é bancário. Enfim, tem-se um emprego, tem-se o exercício de alguma profissão, entra-se na repartição pública. Tem valor de troca, mas não tem valor em si. Cada vez mais a gente sente esse declínio do Direito e da educação jurídica. Isso não é só da educação jurídica: também as outras faculdades sofrem isso de forma aguda; a medicina e a engenharia também, se bem que aí menos, mas todas as profissões sofrem este fenômeno. O sentido em si da educação, da formação do homem, da sua preparação para a vida profissional, este conhecimento abrangente, teórico, ao qual a sua pergunta se referia, realmente desaparece nesse momento da massificação.

O que estava dizendo aqui, há pouco, é que lutar contra a massificação não é — poderia ser idealmente — inverter o processo. Isso seria uma postura irreal. De uma hora para outra a gente passa a ter, de novo, vinte mil estudantes de Direito: é uma ilusão. Não vamos conseguir isso, como também não vamos conseguir diminuir, nem apertando ao máximo o exame de Ordem que realmente fosse reconhecido, aceito e estabelecido, nem assim conseguiríamos diminuir radicalmente o número de profissionais; nem assim talvez nós conseguíssemos efetivamente um controle no gargalo de entrada, de quem deveria ou não entrar para esse exercício profissional. O problema do controle é de fato um problema muito grave. Agora, a sua pergunta, na parte final, se referia exatamente a isso: como é que podemos e devemos fazer para fiscalizar isso? Aqui o impasse é talvez um pouco mais grave do que a gente imagina. É verdade que nos últimos dois anos, principalmente depois que a Ordem dos Advogados — seja reconhecido — entrou na luta a gritar contra a má qualidade do ensino e suas consequências, a coisa tem se agitado nacionalmente. Mas ainda persiste uma situação nos seguintes termos: todos os agentes que deveriam eventualmente estar interessados na transformação e na fiscalização do próprio ensino, não agem. Se omitem de uma forma desastrosa, e isso faz com que a situação persevere, e até mesmo se agrave. Assim, por exemplo, um agente importante nessa fiscalização e nessa transformação, seria o próprio Estado; nos últimos dez anos o Estado não tez muito esforço nesse sentido, inclusive porque não tinha interesse. Uma transformação no ensino do Direito tem perigosas implicações inclusive econômicas para a sobrevivência das universidades brasileiras.

O Ministério da Educação tem dados que demonstram que nas universidades brasileiras ou naqueles conglomerados de faculdades que ainda não são universidades, as faculdades de Direito tem, na economia universitária, uma importância muito grande. Nas universidades particulares, os estudantes de Direito pagam três vezes o seu curso: pagam porque pagam o preço do curso que lhes é exigido; pagam porque de alguma maneira contribuem com impostos e pagam porque o ensino jurídico, tendo um custo baixo, o dinheiro que entra é transferido para aquelas faculdades que têm custo alto: medicina, engenharia, etc. Então o sujeito paga três vezes. Isso nas universidades públicas também ocorre; as faculdades de Direito absorvem estudantes, tem custo baixo e permite que as verbas vão para outras faculdades. Ora, essa situação faz com que, dentro da própria universidade, com o apoio estatal, a possibilidade de transformação da situação diminua; o interesse é pequeno de mudar; talvez exista idealmente o interesse, mas na hora "H", no frigir dos ovos, não é fácil mudar isso. Se colocarmos o bisturi, desse tumor pode sair coisa desinteressante, vai atrapalhar a estrutura do ensino tal como ele está hoje, que bem ou mal se aguenta. E ao Estado não convém uma convulsão social muito grande. Resultado: tendo em vista estas distorções, o Estado, pelo menos nos últimos dez anos foi se omitindo, foi deixando que a coisa acontecesse: era uma forma, digamos, de financiar o ensino superior no Brasil. Então se omitiu; e se omitiu também no que diz respeito, claro, ao controle de vagas; principalmente depois daquela época de muitas convulsões, a absorção de vagas pelo ensino superior começou a ter uma demanda socialmente reconhecida e então não podia se mexer nisso. E até hoje não se mexeu.

Outro agente de transformação seria o próprio mercado de trabalho. Por que não? Afinal, nosso mercado não está insatisfeito? Então que exijam das faculdades e das universidades um ensino mais adequado, melhor. No entanto, lastimavelmente, o mercado não pressiona as faculdades de Direito porque passa à margem. A OAB, sim, tenta controlar a qualidade dos seus inscritos; mas o mercado, que tem que controlar também a qualidade dos seus profissionais, o faz de outra maneira, por exemplo através de reciclagem. Hoje em dia há uma mentalidade no sentido de que esta reciclagem é que afinal de contas vai nos interessar. E como se o mercado dissesse: "bom, forme-me do jeito que vocês quiserem, os nossos profissionais nós vamos formar do nosso jeito, nós reciclamos, nós pagamos cursinhos, pagamos estágios." E vão reciclando de alguma maneira; é claro que isso tem custos para uma empresa, mas a verdade é que o mercado não pressiona a transformação, ele procura a reciclagem do profissional por conta própria, não força uma alteração das faculdades de Direito. Ao contrário, pesquisas mostram — pelo menos nas grandes empresas, nas grandes companhias empresariais brasileiras, tanto públicas quanto privadas — que a figura do advogado não é uma figura importante, é uma figura que é absorvida e transformada internamente, isto é, reconhecem que a faculdade de Direito não forma o profissional necessário, adequado, mas isso não tem muita importância, deixam assim mesmo porque não confiam nessa possibilidade de transformação.

Outro elemento que poderia atuar como agente de transformação é, evidentemente, o próprio alunado. O estudante poderia tomar consciência da sua situação e tentar mudar. Mas, como disse há pouco, a partir do segundo ano ele entra num processo de desilusão, ele percebe as inadequações do ensino em relação à vida profissional e pressiona, mas pressiona de um modo contrário. A partir do segundo ano ele não quer transformação, porque é óbvio que qualquer transformação implica custos e custos de tempo, de dificuldades, de material, de maior dedicação. Tudo isso atinge o estudante que, então, pressiona no sentido oposto. "Não, deixa assim; quero que essas transformações ocorram para quem vem, para mim não; vou sair daqui o mais depressa possível."

Então o estudante acaba não pressionando; pressionam o líder estudantil, o centro acadêmico; mas a massa do estudante não pressiona; na hora "H" recua. É compreensível. Um outro elemento pressionador talvez devesse ser a classe docente, os professores de faculdade. Lastimavelmente isso também não ocorre, porque a transformação do ensino jurídico custa muito trabalho ao profissional docente. Digamos, com toda sinceridade, é muito mais fácil chegar aqui nesta classe, como faço todas as semanas, me dirigir aos alunos e falar durante quarenta e cinco minutos e ir embora. Que me custa isso? Principalmente depois de alguns anos, que a gente começa a saber quase de cor aquilo que fala? Há, sim, um mínimo de dispêndio.

Se tentar uma modificação no meu próprio método de ensino, tentar um controle maior em relação aos alunos, vou ter que trabalhar muito mais, vou ter que mudar minha mentalidade, vou ter que estudar de novo, etc. Resultado: há um certa acomodação. Essa acomodação encontra também uma certa compensação na própria literatura didática brasileira, uma literatura – em termos didáticos — calcada nos livros que conhecemos há cem anos. Se o professor quer mudar, não encontra literatura para mudar. Nem para ele estudar, nem para oferecer, aos alunos. O professor que queira trazer aos alunos livros que tem acesso, não tem condições de fazer isso. Digamos assim: há trinta anos atrás, quarenta anos atrás, talvez nós pudéssemos ensinar, pelo menos pedir, orientar e sugerir que lessem CHIOVENDA, CARNELLUTTI. Hoje em dia, com a massificação e esse tipo de estudante que temos, o acesso a livros de autores como estes é muito difícil. Conheço livros que tinha até vontade de fazer com que os alunos lessem, mas o custo é muito alto. Quando eu tinha trinta alunos, na pós-graduação por exemplo, dava para exigir. É esse o livro e os senhores se virem. Agora, na graduação, quando são duzentos e vinte, quatrocentos e cinqüenta, essa exigência para o aluno se torna difícil. A literatura não só não se modernizou, como não há acesso à literatura clássica. Resultado: também desse lado não há pressão, o próprio professor que produz livros não pressiona uma mudança no ensino; deixa a coisa correr porque também vende seus pequenos manuais; há uma vantagem.

Finalmente, as próprias faculdades, em termos administrativos, também não querem mudar; isso implicaria evidentemente custos operacionais. Aqui na faculdade de Direito, aqui mesmo — é verdade que estamos aprisionados, todos conscientes de que o prédio se tornou muito pequeno, etc. — se tentássemos alterações no ensino jurídico, dentro da faculdade, os empecilhos seriam imensos em termos administrativos. As classes, por exemplo, são preparadas aqui para receber cem alunos, nós temos pouquíssimas classes para grupos de dez, quinze, vinte alunos; então a tentativa de mudar até técnicas de ensino, nesse sentido, esbarra em dificuldades desse gênero. E a administração arranca os cabelos quando propostas desse gênero são feitas, porque alteram todas as rotinas. Sabemos que uma das características básicas da burocracia é o respeito às rotinas, mais do que o respeito, o apego às rotinas. Resultado: as administrações também não pressionam para a mudança. Qualquer proposta de transformação do ensino, com maior fiscalização da qualidade, esbarra nesta relativa omissão de todos esses grupos sociais ou pelo menos encontra nessa resistência uma grande dificuldade de implantação. Estou dizendo isso porque comecei a minha conferência dizendo que faz dez anos pelo menos que eu venho pensando no problema do ensino jurídico e sem esmorecer, mas não posso deixar de realisticamente colocar o pé no chão e ver onde é que estão os pontos de maior dificuldade para uma alteração.

Plenário — A má formação do advogado, a criação de árbitros, o juizado de pequenas causas etc., farão desaparecer o verdadeiro advogado?

Dr. Tércio Sampaio Ferraz Jr. — A figura sugerida, do verdadeiro advogado, é uma figura contraditória tendo em vista exatamente o quadro sócio-histórico que tentei apresentar. O que é este verdadeiro advogado? Se jogarmos com a imagem de 50, de 40 anos atrás, a figura se identifica com aquele advogado de cultura humanística, voltado para uma erudição abrangente. O verdadeiro advogado, a partir dos anos cinqüenta, começa a se identificar com essa figura de especialista, no início um especialista bem intencionado, no sentido de um teórico do Direito que começa a se interessar por diversos campos da informação, mas pouco a pouco derivando para a figura do agente do Direito positivo, homem que conhece determinados campos com uma certa maestria e portanto que instrumentaliza o Direito de tal maneira que é capaz de quebrar os galhos, por assim dizer, que apareçam. Portanto, a figura do verdadeiro advogado é uma figura controvertida; mas, assim mesmo acho que posso compreender, do ponto de vista ético, o que a pergunta propõe. Na verdade, a má formação e o aparecimento eventual de juizados deste gênero, como diz a pergunta, não acredito que façam desaparecer o verdadeiro advogado, mas sem dúvida vão acabar exigindo uma transformação na figura do profissional. Tenho a impressão que um modo de enfrentarmos com realismo a massificação do ensino e da profissão, é criar condições de abertura, isto é, diversificar a própria formação profissional. Esta é a resposta, por exemplo, que encontramos — é verdade que é uma cultura diferente — nos EUA, em parte. Você tem diferentes tipos de profissionais, reconhecidos nos seus tipos, com formação diferente, com graus de complexidade diferentes. Isso não é muito fácil de se implantar num país como o nosso onde a tradição é compacta, quer dizer, o profissional é aquele que concluiu o seu curso em quatro ou cinco anos, compactamente. É difícil a gente entender isso. Não tenho muita idéia de como a gente poderia implantar isso, mas a gente sente a necessidade de diversificar um pouco a formação desse profissional, tendo em vista as diversas situações, e acho que talvez esse seja um caminho para os próximos vinte anos. Tenho isso na idéia, vamos dizer assim. Acho, no momento atual, muito difícil a recepção dessa idéia, mas creio que até o final deste século esta diversificação vai ocorrer. A idéia do verdadeiro advogado, como advogado compacto mais tradicional, tende a desaparecer mesmo. Pelo menos é o que vislumbro se a tomada do desenvolvimento da sociedade brasileira seguir na direção que estamos percebendo hoje, que é esta direção que apontei dos anos cinqüenta para cá.

Plenário - E quanto à especialização, não estaria sendo prematura? Não seria conveniente uma opção futura? O ensino jurídico deve ser, como nos anos cinqüenta, humanista? Isso daria muita capacidade aos bacharelandos para exercer a sua profissão?

Qual a opinião de V. Exa.?

Dr. Tércio Sampaio Ferraz Jr. — A minha opinião foi proposta e encaminhada ao Conselho Federal de Educação e começou a ser discutida recentemente no congresso das faculdades de Direito, no Ceara. Esta proposta tenta recuperar alguma coisa do chamado ensino humanístico, anterior aos anos cinqüenta. Mas não o restaura nos mesmos moldes.

A proposta feita é uma proposta mais provocativa, pelo menos na minha intenção e de alguns de meus colegas, do que uma proposta que se pretende passível de realização ou de implantação imediata. No fundo é mais para provocar o debate, ver se o público começa a tomar consciência. Essa proposta não se baseia, mas se inspira um pouco num experimento que está ocorrendo há quatro anos na Alemanha. Ela acontece numa universidade alemã que está tentando formar — eles também têm problemas com o ensino jurídico — os seus juristas de uma forma diferente. Na Alemanha, tradicionalmente, a formação de um bacharel em Direito demora em média seis, sete anos. E depois ainda há o estágio obrigatório de dois anos. Em média eles ficam lá pelo menos oito anos, pelo menos, estudando para depois começar a exercer a profissão, mais ou menos como o médico aqui. Neste quadro lá na Alemanha, naquela universidade, estão fazendo assim; o estudante passa aproximadamente mais de um terço dos seus estudos, do período original dos seus estudos, digamos de dois a três anos até quatro anos, estudando a realidade social em que o Direito se insere. Então, ele tem um estudo bastante intensivo de conhecimento da sociedade, em ciências sociais de modo geral. Depois desse estudo, passa por uma segunda fase de estudo intensivo do Direito enquanto teoria; aquilo que talvez pudéssemos chamar aqui de teoria geral. Conhecer técnicas teóricas do Direito, não apenas observar doutrinas, mas se tornar capaz de escrever doutrinariamente. Ele tem uma formação maciça nesse sentido. E, no final, passa mais dois anos dentro de uma faculdade, com o que chamam lá de estudo de problemas. Mas não há propriamente especialização no sentido usual da palavra: ele passa a ter estudos de problemas, elege campos problemáticos" onde, então, os estudos anteriores, doutrinários e o conhecimento da realidade social são postos em prática. É uma espécie de antecipação daquilo que acontece de fato na vida prática, onde somos confrontados com questões imediatas, inseridas no contexto sócio-econômico e que têm que ser resolvidas. O estudante passar por esse estudo de problemas não corresponde a uma especialização no sentido de que vai estudar, então, Direito tributário, Direito administrativo. Não! Ele estuda problemas, globalmente, isto é, estuda questões onde vão aparecer problemas de Direito tributário, Direito civil, Direito constitucional, partindo do pressuposto de que o Direito é uma unidade e qualquer problema envolve todos os problemas jurídicos, para ser resolvido cabalmente.

Esse experimento tem quatro anos na Alemanha. Mais ou menos baseado nesse experimento, a comissão propôs algo semelhante, isto é, que aumentássemos, na formação do profissional brasileiro, a carga do conhecimento da sociedade. Do jeito que temos hoje, por exemplo, na faculdade de Direito, a sociologia como matéria obrigatória pelo currículo mínimo. Mas se o sujeito estuda seis meses de sociologia e nunca mais na vida, tanto faz como não faz. Realmente é uma perfumaria, para usar uma expressão antiga. É absolutamente inócuo, seis meses de sociologia num curso de cinco anos. Não adianta absolutamente nada; a mesma coisa se diga para economia, também seis meses, num curso de cinco anos; aquilo se perde, tanto faz. Essas disciplinas, que deveriam dar a visão social do Direito, se perdem no curso tal como está estruturado hoje.

Na proposta dessa comissão, essas disciplinas junto com as disciplinas chamadas teóricas — teoria geral do Direito Civil, teoria geral do Direito Processual, teoria geral do Direito do Trabalho — teriam uma importância muito maior e tomariam praticamente dois terços do curso no Brasil, que teria obrigatoriamente cinco anos, como é aqui no Largo São Francisco e não mais quatro anos ou três anos e meio, como ocorre em outras faculdades. A formação maciça de conhecimento da sociedade, junto com as teorias gerais, aí sim, no final do curso, complementada não por um estudo de problemas — nós não temos condições no Brasil para isso, ainda —, mas por um tipo de especialização em áreas de Direito como nós temos aqui no Largo São Francisco, que, vocês sabem, é a única faculdade no Brasil que tem isso no quinto ano da faculdade. A tentativa seria portanto de recuperar, não propriamente um curso humanista, mas pelo menos uma visão social do Direito na formação dos juristas. Essa é uma proposta mais provocativa, pois esbarra, como disse há pouco, em professores (tem que haver concomitantemente uma formação docente mais intensa e mais bem feita) e, acima de tudo, é uma proposta que não atende ao problema da diversificação do ensino. Ele procura ainda ver o profissional do Direito mais como um profissional, como diria nos termos da pergunta anterior, do que como o verdadeiro advogado. Tem esses defeitos ou essa virtude, se quiserem; quer dizer, não é uma visão que enfrenta a massificação tentando se adaptar a ela, mas é uma visão que enfrenta a massificação contra a massificação. Mas, por isso mesmo estou dizendo que ela é mais provocativa do que realmente possa ser transformada em realidade, de um dia para outro, exatamente porque os propositores têm consciência da massificação e dos problemas que traz. É que o ensino dificilmente seria adaptado a cem mil estudantes no país; mas quem sabe isso nos alertará pelo menos para a necessidade de grupos profissionais que tenham essa formação. Alguns deles pelo menos.

Na apresentação do tema, acho que não fiz nenhuma proposta; na realidade terminei com uma interrogação. Mas depois respondendo às perguntas, como eu imaginei, a possibilidade de algumas propostas foi surgindo. Em termos concretos acho que a primeira delas foi: "A massificação do ensino do Direito e do ensino universitário de modo geral é uma realidade que não podemos enfrentar de forma meramente idealista, isto é, ela faz exigências de tal profundidade que é impossível propugnarmos por uma mudança no ensino esquecendo a massifícação." Essa seria, digamos assim, a primeira proposta. As transformações do ensino, portanto, têm que ser não adaptadas à massificação, mas, pelo menos, adequadas às condicionantes que ela impõe. Ê uma ilusão querermos, de uma hora para outra, reduzir de cem mil para vinte mil o número de estudantes no Brasil. Temos de nos adaptar a isso, pelo menos temos que partir daí.

A segunda proposta, seria no seguinte sentido: "Não é possível — acho que a OAB está ajudando muito aí — jogarmos a responsabilidade da alteração das condições de ensino, do seu aperfeiçoamento, nos ombros das faculdades de Direito e do Ministério da Educação ou das secretarias de educação. A diversidade de agentes que possam estar interessados e que eventualmente vão atuar além do Estado, além das faculdades, os professores, os próprios profissionais, os próprios alunos, o próprio mercado de trabalho, as empresas públicas, as empresas privadas, todos esses agentes têm que ser mobilizados para essa transformação. Não podemos jogar com um agen-te só. Quer dizer, o problema da reforma de ensino não é um problema das faculdades de Direito, essa é a verdade." Acho que a OAB está contribuindo para essa mobilização e acho que ela deveria ir até mais adiante, começar a provocar essa mobilização nesses outros setores aos quais me referi.

A terceira proposta, que eventualmente poderia configurar de todo este conjunto de debates, está na tentativa de pensarmos uma alteração no ensino jurídico tendo em vista todas as condicionantes sociais, de modo a que não nos voltemos única e exclusivamente para uma visão elitista da formação profissional. De tal maneira que pensemos na diversidade dos problemas brasileiros e, em conseqüência, na dos problemas jurídicos que são por eles proporcionados; e que tentemos fórmulas de alteração do ensino jurídico que façam frente a essa diversidade.

Voltando ao evento anterior, assim como — e esse não é um problema apenas da faculdade de Direito — assim como as faculdades de engenharia, por exemplo, têm a ilusão ou pelo menos têm a pretensão de formarem engenheiros que serão diretores de grandes empresas, também as faculdades de Direito têm um pouco essa ilusão e essa pretensão. A postura do ensino dentro de uma faculdade é de formar o ápice da profissão. Isso é bom no sentido ideal do ponto de observação, mas não é bom tendo em vista uma sociedade massificada como temos. Então a terceira proposta é: "Vamos tentar observar as necessidades sociais tendo em vista a sua diversidade. Isso talvez nos alerte para um conjunto de problemas sociais para os quais nós não temos respostas jurídicas no momento. O exemplo que lhes citei, o número de juizes absolutamente desproporcional à população brasileira, nos mostra que os conflitos sociais no Brasil não são resolvidos pelo Judiciário, claramente. Como poderiam ser resolvidos? Não haveria aí o papel para alguém com formação jurídica? Por que não incluir dentro das universidades, também, uma formação jurídica para este tipo de atendimento, que terá talvez que ser diferente da que tem o grande advogado? Por que não começaremos já a pensar em termos sociais mais amplos? Talvez fosse uma forma de enfrentar a relação ensino jurídico/demanda social."

Acho que estas três propostas são suficientes para as necessidades.

Dr. José Célio Manso Vieira — Não houve nenhuma proposição por parte dos senhores, as proposições acabaram sendo formuladas pelo nosso ilustre relator e conferencista. E eu pediria ao dr. Hamilton Pina que lesse as conclusões e as proposições do relator e as submeteria à votação.

Dr. Hamilton Penna — o Dr. Tércio fez três proposições que, naturalmente, devido à sua grande erudição e à sua facilidade de falar, fui apanhando aqui e acolá algumas palavras e então não sei se fui muito fiel ao seu pensamento. Ele faria a fineza de me interromper, se for o caso, e nós faremos a correção. Coloquei mais dados, no sentido de que depois, possivelmente eu e ele, faríamos a redação final, mas conservando o espírito, que seria o seguinte:

Na proposição "A" (problema da massificação), entende o professor Tércio que é impossível enfrentar a realidade sem aceitar esse dado irreversível, precisamos adaptarmo-nos a ela.

A proposição "B": "A responsabilidade quanto aos problemas do ensino não pode ser atribuída às faculdades, ao MEC, à Secretaria do Estado, única e exclusivamente, sendo necessário uma mobilização maior dos diversos segmentos para a solução do problema."

A proposição "C": "Pensarmos numa alteração do ensino jurídico de modo que não nos vertemos para uma visão elitista desse ensino, tomando essa expressão no sentido sociológico, com bastante sentido prático, face a realidade social em sua real diversidade."

São essas as proposições colocadas pelo conferencista. Os que estiverem de acordo permaneçam como estão. As proposições estão aprovadas.

Fonte: Revista do Advogado, AASP, São Paulo: 1983, pp. 39-50.