Realidade política brasileira

Tercio Sampaio Ferraz Jr.

1 — Um período do transição
Afirmou o Sr. San. Tiago Dantas em seu discurso pronunciado na homenagem que lhe foi prestada como "Homem de Visão de 1963" pela revista Visão: "Um país, onde se desencoraja a empresa privada ao mesmo tempo que se deteriora a empresa pública, nem está preparado para uma expansão capitalista, nem para uma socialização, mas está simplesmente deixando-se ir ao impulso de uma corrente descendente, que pode ancorá-lo numa estagnação a longo prazo ou precipitá-lo na desordem social".

Esta situação de impasse que atravessamos define exatamente o que se pode chamar na sua pureza, de um período de transição. As forças políticas se estruturam em torno de projetos, apenas parcialmente aceitos pelos demais grupos, de tal modo, que não se consegue criar as condições mínimas de confiança na viabilidade de uma planificação governamental que possa superar o atual estágio de desorganização econômica, administrativa, política em que vivemos. Avizinha-se, deste modo, a. grande crise que nos poderá levar a uma estática marginalizadora ou a uma dinâmica de conseqüências imprevisíveis.

2 — As velhas estruturas políticas e o estágio de transição

Assinala-se no momento atual a coexistência de diversos comportamentos políticos, cujas raízes devem ser buscadas na própria formação política brasileira. Quando falamos em momento de transição cumpre lembrar .que esta passagem se realiza entre uma estrutura que se poderia chamar in totum de colonial para uma política de desenvolvimento (entendida a palavra na acepção restrita em que a empregamos hoje), o que significará o advento de uma nova estrutura. Assim para bem compreender esta transição, as forças políticas que nela se debatem, devemos começar por estudar os condicionamentos da velha estrutura colonial.

Caracterizada economicamente por uma "dominância dos aparelhos extrativos de produção, o total condicionamento pelo mercado externo, a completa ausência da acumulação e da preocupação com a produtividade"; sociologicamente pela ausência de povo no contexto social e de classes propriamente ditas; culturalmente "pela existência de minorias meramente dominantes e não criadoras"; poeticamente a estrutura colonial se caracterizou "por determinadas constantes de articulações entre as unidades reais de poder e a instrumentação das instituições, mediante a política de oligarquia e a política de clientela", (op. cit. C. A. Mendes de Almeida, pág. 63).

3 — Política de oligarquia

A manifestação mais autêntica da política de oligarquia na estrutura colonial brasileira reside no fenômeno, do coronelismo. Toda a vida política desses grupos sociais localizados sobretudo nas zonas rurais girou durante muito tempo em torno de figuras patriarcais, resultando daí um mero jogo de prestígio e controle social exercido pelas principais famílias, não existindo verdadeiramente formações partidárias propriamente ditas, embora começasse a tomar corpo o partido como "tronco de fidelidades de sangue". A característica fundamenta] da política de oligarquia reside na descontinuidade administrativa através da mudança total dos quadros dirigentes, cada qual interessado em apagar o anterior em troca do realce do seu próprio grupo, fruto da competição localizada, como vimos, no prestígio familiar e pessoal.

4 — Política do clientela

A segunda herança política da estrutura colonial (latu sensu) resultou da impossibilidade existencial da classe média como elemento ativo nas decisões nacionais. Condicionada por uma economia meramente extrativa, essa estrutura não encontrou lugar para uma classe que nem fosse mão-de-obra indiferenciada nem detentora do capital. Ora, como compensar, então, a ausência de atuação política dessa classe que possuía certa relevância social? A solução foi a institucionalização do chamado "estado cartorial", conforme nos diz Hélio Jaguaribe (op. cit. pág. 175) e da política de clientela, criando-se um enorme aparelho burocrático cuja função não seria a de aparelhar-se para exercer a função administrativa, mas apenas .para acomodar a classe média, daí por diante, em grande parte, uma classe de funcionários públicos.

Neste período do desenvolvimento do estado brasileiro, a máquina burocrática é paradoxalmente cada vez maior e cada vez mais ineficiente. As disputas eleitorais. giram agora em torno não mais de prestígio familiar, mas de defesa das respectivas "clientelas", onde a ascensão ao poder não é um meio para uma finalidade administrativa, mas um fim em si. É o poder pelo poder. Não há tentativa de elaboração de programas governamentais, mas simples garantia da estrutura. O Estado existe para não funcionar.

Os processos de manutenção estrutural pelo poder giram em torno do "cabo eleitoral", cuja função é a de barganhar o apoio político com a vantagem pessoal do eleitor no aparelho burocrático, é a política do pelego, etc., etc. Como consequência, os partidos clientelísticos não funcionam senão apenas durante a safra eleitoral, entrando depois numa hibernação total, desde que acertados os "contratos" entre as clientelas.

5 — Os movimentos aluais. A política de grupo de pressão

A atualidade superou, através da diversificação social, os velhos processos de garantia do poder e de acesso a ele. Não mais se encontram os métodos estratificados da estrutura colonial, em que os donos da economia extrativa e das clientelas eram automaticamente os titulares do poder político, mas o período de transição propicia o aparecimento de um ''conjunto de canais subterrâneos que associariam as novas constelações de interesse econômico, com mecanismo de opinião pública (jornais, estações de rádio, televisão) e com determinado conjunto de parlamentares, muitas vezes aliciado em partidos antagônicos". (A. C. Mendes de Almeida, op. cit. pág. 69).

O aparecimento de tais grupos dá-se sobretudo pela ruptura da ordem tranquilamente estratificada entre infra e superestrutura. Surge, então, a necessidade de órgãos que exerçam uma mediação entre elas, o que é feito, principalmente, através do controle e da exploração da opinião pública expressa em jornais, rádio ou televisão. Este controle e exploração são executados pelos grupos de pressão, estruturas super partidárias, ligados, sobretudo, aos grupos econômicos da nascente burguesia empresarial, e ao proletariado cartorial peleguista.

6 — Os movimentos atuais: a política de ideologia

O aparecimento dos grupos de pressão (cujo exemplo patente se verifica na realidade brasileira através da formação e atuação das múltiplas associações profissionais, econômicas, partidárias, como CGT, Clubes Militares, Frentes Parlamentares, etc.) indica razoavelmente o advento da política de ideologia, num futuro extrema mente próximo.

Entendemos ideologia, neste caso, como um "esforço de racionalização das vivências e dos interesses de um grupo, de uma classe, de um movimento histórico" (Pe. H. Vaz, op. cit. pág. 9). Nestes termos, a política dos grupos de pressão tende a se racionalizar e a se institucionalizar numa série de princípios, de modo a se transformar em expressão fiel de uma maturidade política ainda não atingida. A conscientização dos grupos e classes, aliás, como movimentos históricos, beneficiaria o próprio regime, através de uma revisão partidária em termos efetivamente racionais e verdadeiramente representativos das várias camadas sociais que compõem a sociedade brasileira.

Entretanto, o momento atual não se definiu totalmente em torno do problema ideológico, permanecendo, outrossim, na perigosa e improdutiva esfera da pseudo-ideologia e da radicalização dos sentimentos e não das ideias. Vamos por partes.

A pseudo-ideologia vive sobretudo dos vícios do regime e não de questões positivas. Como? Na crítica às estruturas vigentes, alguns partidos, formados das classes não comprometidas com as estruturas econômicas, principalmente as classes médias, tendem a apontar os vícios do regime atual clientelístico, invocando para tanto princípios e idéias importados de centros culturais. alienígenas, aplicando-os (num movimento inverso ao da verdadeira ideologia) dê cima para baixo, das cúpulas para a base, encontrando, logicamente, enormes dificuldades para a acomodação da teoria à prática, da doutrina à realidade social. Exemplo claro e patente deste fenômeno pode ser encontrado no PDC, cuja "ideologia", baseada em modelos de superação do capitalismo liberal de países desenvolvidos, não encontra meios concretos de pronta aplicabilidade à realidade brasileira, caracteristicamente, subdesenvolvida e que não atingiu ainda as formas de maturidade e as etapas de desenvolvimento das nações europeias, por exemplo. Em consequência, tais partidos (e o PDC ainda nos é útil) manifestam frequentemente cisões e disputas internas, permanecendo numa crise constante, numa dicotomia entre uma pregação meramente moral, de revisão moral apenas dos homens ou de reformas inócuas que nada reformam, na verdade, e uma pregação avançada, de transformação efetiva das estruturas, mas que diverge da "ideologia" modelo, dos princípios importados. De uma parte — observando o momento atual — o grosso do partido (o PDC) disputando as áreas políticas da UDN (manifestamente neocapitalista), e de outra, os elementos rebeldes (linha Paulo de Tarso), recusando-lhe até mesmo alguns princípios e enfileirando-se em outros grupos divergentes do modelo pedessista.

7 — Simultaneidade dos diversos tipos de política no atual momento de transição

A transição política que atravessamos se caracterizaria, sobretudo, pela tentativa dos vários tipos de política de se manterem uns e de se imporem outros, provocando uma esdrúxula simultaneidade de tendências entre si incompatíveis.

A superação histórica da era colonial não conseguiu extirpar de todo a política de oligarquia, cujos exemplos dominantes podem ser localizados ainda hoje em inúmeras regiões rurais brasileiras, em cujas estruturas sobrevive o "coronelismo" adaptado às novas condições. Por outro lado, a ineficiência palpável dos partidos, sua existência esporádica apenas nos períodos eleitorais, o exercício do governo confiado a homens e não a partidos, o messianismo político, demonstram a vigência atual da política de clientela. Finalmente, a conscientização crescente do eleitorado urbano, a radicalização dos sentimento em torno de ideais ainda vagos, manifestam a existência da política dos grupos de pressão e o advento para breve da política de ideologia. (Cf. C. A. Mendes de Almeida, op. cit. pág. 72).

Todas estas tendências atuais podem ser apreciadas com vantagem no próprio cenário político brasileiro. A política de oligarquia e de clientela engloba, assim, grupos curiosamente opostos, interessados todos em manterem seus respectivos modelos. O primeiro deles corresponde ao que Hélio Jaguaribe (op. cit. pág. 203) denomina de "cosmopolitismo liberal", e é representativo "dos interesses constituídos desde os tempos coloniais, abrangendo os setores da burguesia urbana mercantil, da burguesia rural senhorial, da burguesia rural capitalista e da classe média urbana tradicional". Sua formulação básica admite que, para a superação do subdesenvolvimento, devemos incrementar sem barreiras em solo brasileiro a aplicação do capital estrangeiro, assegurando-se às empresas condições plenas de liberdade de movimento e de atuação. É a posição adotada pela maioria da UDN e boa parte do PSD, perfilhada pelos grandes jornais nacionais como O Globo, O Estado de São Paulo, etc. teoricamente defendida por economistas como Eugêncio Gudin, Otávio de Bulhões, etc. Esse grupo mantém posições oligárquicas e clientelísticas conforme descrevemos acima, mas sobretudo clientelísticas (reforma moral, partidos ineficazes, redução dá atividade governamental à discussão do orçamento). A seu lado, com ligeira divergência técnica, colocamos o "cosmopolitismo desenvolvimentista", ainda na formulação de H. Jaguaribe, grupo que procura restringir ao mínimo a intervenção do Estado na economia e admite como único meio de superação do subdesenvolvimento a injeção de capital estrangeiro, embora mais ou menos controlada pelo poder público. Corresponde politicamente, aos novos quadros da UDN (ala bossa-nova), setores do PSD (sul), ao movimento dissidente do PTB, o MTR, tendo como grande teórico o economista Roberto Campos, sendo perfilhado por jornais como As Folhas de São Paulo, o Jornal do Comércio, etc. Ambos, porém, cosmopolitismo liberal e desenvolvimentista, integram também importantes grupos de pressão, exercendo sua atuação, através dos jornais, sobre a opinião pública e sobre o Congresso, formando uma infinidade de associações de caráter econômico-profissional, como associações rurais, federações industriais, etc. Nesta ordem de ideias, tendem a constituir uma política de ideologia, da qual é um dos partícipes, sob a epígrafe geral do "neocapitalismo".

Outro grupo importante que procura ainda manter de algum modo as velhas bases clientelísticas, embora vá também, aos poucos, constituindo-se e diversificando-se em grupos de pressão para daí chegar à política de ideologia, é o que Jaguaribe denomina de "nacionalismo socializante burocrático". O grupo nacionalista, de um modo geral, sustenta que o desenvolvimento brasileiro deve ser feito através do capital nacional, por mais escasso que seja ele. O nacionalismo socialista subdivide-se em estatista e burocrático. Apenas o segundo por ora nos interessa. Pretende ele, com uma maleabilidade espantosa que o leva mais ao oportunismo que ao socialismo propriamente dito, uma série de reivindicações onde se mesclam empresa pública e privada, redistribuição da renda e aumento da taxa de capitalização, etc. Sua base é mais pragmática do que teórica. Corresponde ao grupo PTB liderado por João Goulart, com teóricos como Roland Corbisier, Guerreiro Ramos, sendo a linha seguida pela Última Hora, O Semanário e outros periódicos. Representa, como o cosmopolitismo liberal e desenvolvimentista, uma tentativa renovada de manutenção da política clientelística, através de sindicatos e de instituto do peleguismo que nada mais é que uma reedição do velho clientelismo do império dos primeiros anos da república.

Em reação contra esta política de oligarquia e clientela, existem, na moderna realidade política brasileira, outros grupos que se têm estruturado menos em partidos do que em associações, institutos, publicações, através do que procura se constituir em grupos de pressão, com vistas a uma futura política de ideologia, trabalhando por de trás dos partidos, na Frentes Únicas, etc. Correspondem, ainda na terminologia de H. Jaguaribe, ao nacionalismo socializante estatista e ao nacionalismo desenvolvimentista. O primeiro, sensivelmente encoberto pela ação do nacionalismo socializante burocrático, tem caráter predominante marxista, é integrado por uma minoria comunista e por uma grande parte de marxistas livres. Prega a estatização dos meios de produção como método de superação do subdesenvolvimento. Lideram esta corrente teóricos como Caio Prado Jr., Nelson Werneck Sodré e outros. Nos dias de hoje possuem um órgão de grande representatividade como é o ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), liderado entre outras pelo professor Álvaro Vieira Pinto.

O nacionalismo desenvolvimentista, finalmente, não considera a estatização como um fim em si, nem pretende, como o socialismo burocrático, a redistribuição da renda sem aumento imediato da produção, mas conserva a prerrogativa do capital nacional sobre o estrangeiro, embora não negue a sua importância. Opõe-se, antes, à tendência de se entregar a função mais importante do desenvolvimento ao capital alienígena. Politicamente, o nacionalismo desenvolvimentista teve algum sucesso no Governo Kubitschek, sobrevivendo, partidariamente, na ala não comprometida com o clientelismo peleguista do PTB, liderada pelo prof. Santiago Dantas. Além deste, possui outros teóricos importantes como Hélio Jaguaribe, Cândido Antônio Mendes de Almeida, Celso Furtado, etc. Linha manifestamente seguida por um periódico como o Jornal do Brasil e revistas como a Síntese, possui um importante grupo de trabalho localizado na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

8. — O futuro: a política tecnológica

Como vimos, o momento de transição que atravessamos se traduz numa série de tendências conservadoras e inovadoras coexistindo simultaneamente. A política clientelística sobrevivendo no cosmopolitismo liberal e desenvolvimentista e renascendo no nacionalismo socializante burocrático; a política de ideologia esboçando-se no nacionalismo desenvolvimentista e socializante estatista; em todos, a política grupos de pressão atuando e sugerindo o advento efetivo da política de ideologia. De um modo geral, porémn, a predominância da política de clientela, na sua forma antiga e renovada.

Aliás esta predominância, ao que se acrescenta o desenfreado processo de radicalização da política nacional, provoca, afinal, uma situação mais ou menos definida no movimento partidário radicalizado. Assim: sendo a política de clientela, antiga e renovada, a predominante; sendo ela representada principalmente, nas suas maiores forças, pelo cosmopolitismo liberal de um lado e pelo nacionalismo socializante burocrático, de outro; estando o país em processo de radicalização: aqueles dois grupos tendem a polarizar todas as manifestações políticas, abforvendo, irracionalmente, os demais. O cosmopolitismo liberal agrega, na radicalização das disputas, o cosmopolitismo desenvolvimentista, isto é, os seus opositores, os nacionalistas socializantes burocráticos, liderados pelo ex-presidente Goulart, tendem a empurrá-los (os desenvolvimentistas) para o grupo liberal extremado. E o nacionalismo socializante burocrático agrega, por imposição dos opositores, os nacionalistas socializantes estatistas e os nacionalistas desenvolvimentistas. E a política fica apenas: Lacerda ou anti-Lacerda; Jango ou anti-Jango.

O advento da política de ideologia, entretanto, anuncia a possibilidade futura da política tecnológica, onde, cada vez mais, o problema técnico da administração tomará importância. O poder público terá. então, de encarar com seriedade os subsídios científicos que os estudos sistemáticos da realidade lhe proporcionará. Superar-se-á, desta forma, a administração de "palpites", com o planejamento racional da atividade governamental. Como pode perceber o leitor, dos grupos que apontamos, três sobretudo, se encaminham nessa direção: o cosmopolita desenvolvimentista, o nacionalista socializante estatista, o nacionalista desenvolvimentista, silenciados, confundidos e envolvidos, porém, pela radicalização. Entretanto, assistimos hoje a um fato significativo para o advento da política tecnológica: a atuação da SUDENE, administrada por um economista, num meio claramente clientelístico e oligárquico, representa, neste período de transição, ainda que incipientemente, mais uma tendência que parece se firmar para o futuro.

9 — A crise de março de 1964

Apresentados os dados do problema será mais fácil entender a situação. Os pressupostos são claros. A política dominante no Brasil até 30 de março era constituída por uma clientela que denominamos "nova." e que dirigia a nação desde 1930. Em. oposição a ela, outra clientela igualmente forte, .a clientela econômica da UDN, PSD, etc., punha-se-lhe numa oposição cerrada e absolutamente antagônica.

A crise de março evidenciou o clímax do processo de radicalização das duas. A que triunfou representa os interesses das classes conforme apontamos supra, os interesses de grupos econômicos importantes, seguidos de sua cauda clientelística. O grupo derrotado, nacionalista socializante burocrático — oportunisticamente aliado ao nacionalismo estatista e comunista que eram e são efetivamente uma minoria — definira-se como política de pelegos.

A bandeira das reformas, que foi empunhada pelo grupo derrotado, entretanto, trazia, em que pese a grande doze de má fé que a acompanhava, uma esperança verdadeira para o povo. Se a derrota deste grupo significou o aniquilamento de uma tal .bandeira, estejamos prontos para enfrentar daqui alguns anos uma revolução bem mais terrível. Se ao contrário, o grupo vencedor entender por bem fazer as reformas como devem ser feitas, teremos marcado um grande passo para a nossa independência econômica e social.

O triunfo da clientela conservadora redundou, de certo modo, numa vantagem, desde que não evolua para uma ditadura não apenas de fato mas ainda mais, de direito. Integrado de homens respeitáveis pela cultura e pelo saber, por certo representa uma porta aberta a reivindicações de caráter desenvolvimentista. O grupo derrotado, por sua vez, teve um grande mérito: o de levantar o problema; seu maior demérito foi a demagogia com que o fez, de tal modo que ao invés de conscientizar as massas simplesmente as agitou.

Como palavra final, cumpre lembrar aos elementos católicos verdadeiramente interessados no problema social que esta é a sua grande oportunidade, a oportunidade daqueles que, sem serem comunistas repudiam igualmente o capitalismo materialista. Esta é a sua hora e se não for aproveitada já, talvez nunca mais o seja.

Não nos deixamos empolgar pelo anticomunismo primário e seu efeito. Lembremo-nos de que a força dos ideais está na ação e não na mera defesa. Não nos esqueçamos, no regozijo ou na derrota, de enfrentar a realidade friamente e verificar o que de melhor deve ser feito. Não nos esqueçamos que o grupo vencedor é também uma clientela e que, como tal, deve ser esclarecida para que evolua, em paz, para posições mais conformes a realidade social de nosso tempo.

BIBLIOGRAFIA SUMARIA:

San Tiago Dantas — Ideias e Rumos para a Revolução Brasileira.

José Olímpio, Ed. 1963. Cândido Mendes de Almeida — Desenvolvimento e Problemática

Do Poder — Síntese, n.« 14, 1962. Hélio Jaguaribe — Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento

Político — Fundo de Cultura, 1962. Pé. Henrique Vaz — A Grande Mensagem de S.S. João XXTJÍ — Síntese, n. 18, 1963.

Fonte: Boletim da Universidade Católica de Campinas, nº 1, Campinas: 1964, pp. 75-87.